quinta-feira, 18 de julho de 2013

Sobre o tempo e os padrões estéticos

É preciso começar dizendo que estou ruminando os dizeres deste post há algumas semanas e que não foi fácil chegar no produto final. Aliás, eu nem sei se posso chamar isso de produto final.

Acredito que não existe UMA pessoa se quer neste mundo que em algum momento da vida não tenha sofrido com sua própria aparência. Desde um dente torto, um nariz não tão certinho, uns quilinhos a mais ou a menos, o excesso ou a falta de curvas, o cabelo muito liso ou muito crespo. Todos nós, homens e mulheres, de algum modo, em algum momento de nossas vidas, já sofremos com os padrões estéticos. Mas, infelizmente, mulheres sofrem muito mais que os homens com a pressão social para se enquadrar em padrões estéticos. Homens gordos são "fofinhos", tem "barriguinha de chopp". Mulheres gordas são "barrigudas", "baleias", "balofas" e "horríveis".

Eu não estou dizendo que homens não sofrem com os padrões estéticos. Estou dizendo que as mulheres sofrem mais que os homens. É só você perder uns minutinhos dando um Google no ranking de cirurgias plásticas e ver o sexo das pessoas que resolveram enfrentar o bisturi. Lá está a mulherada colocando um silicone, fazendo uma lipo, puxando o rosto, dando uma esticada. Clínicas de estéticas são encontradas em todas as esquinas. Recheadas de mulheres em busca do inatingível.

Dia desses saiu uma imagem de como seria a Barbie se fosse baseada no fenótipo REAL da maioria das mulheres, e não na parcela mínima de mulheres que medem 1,70cm, tem as medidas de busto e seio exatamente iguais, cintura fina, são loiras, tem olhos claros e, óbvio, são magras. Aqui as imagens. Agora me diz: com qual Barbie as mulheres reais que você conhece se parecem?

As meninas crescem olhando para as Barbies e sonhando serem iguais a elas. Eu imagino a decepção de uma garotinha negra ao não encontrar nas prateleiras das lojas infantis uma boneca que pareça com si mesma. Ou uma garotinha gorda. Ou uma garotinha com cabelo crespo. Não tem boneca que se pareça com elas! Porque negra, gorda e cabelo crespo é FEIO. E essas garotinhas se decepcionam. Mas só acontece quando elas conseguem adquirir o senso crítico de que aquelas bonecas ~não a representam~ (beijos, Feliciano!). Quando não há esse senso crítico, sabe o que acontece? Elas crescem frustadas e vão viver a vida inteira em busca de uma beleza inatingível. A beleza Barbie, a beleza photoshopada das capas de revistas. Isso é de uma crueldade que eu tenho até raiva só de escrever.

Cresci sofrendo e vendo minhas amigas sofrerem por não ter o corpo que queríamos ter. Nunca era perfeito. O cabelo liso era liso de mais, o cacheado era liso de menos, o seio de uma era muito farto, o da outra era muito pequeno. Era sempre 8 ou 80. Nunca era BOM. Recentemente percebi o quão estúpido isso é. E isso só foi possível porque existe uma coisinha chamada feminismo que abriu meus olhos. Eu, que já era feminista desde muito nova, ainda não tinha percebido o quanto eu me deixava ser levada por essa cultura massacrante do patriarcado de exigir que nós mulheres sejamos aquilo que não somos. Quando percebi, tratei de reler tudo que eu já tinha lido a respeito de pessoas fora do padrão estético e minha conclusão foi a de mandar todos esses fiscais do corpo alheio irem se catar. Me senti tão mais leve depois disso que acho que tudo que eu fizer daqui pra frente será melhor, mais feliz. Todo dia que eu encontro um fiscal do corpo alheio dizendo "nossa, ela podia fazer um regime", "que cabelo RUIM", "coitada, tão magrinha" e qualquer coisa do tipo eu tenho vontade de enfiar a mão na fuça do sujeito.

Se você também consegue ver que nós não precisamos seguir um padrão estético tão exigente, excludente e surreal como o que temos imposto hoje eu quero te dar umas dicas do que fazer para interromper esse ciclo vicioso:
1) Sempre que possível evite dar bonecas do tipo Barbie para meninas. Aliás, evite dar bonecas. Meninas podem brincar com brinquedos muito mais legais que bonecas, batedeiras, ferro de passar e cozinhas de plástico. É sério. Dê um jogo, um quebra-cabeça, uma massa de modelar.
2) Explique para as crianças que te rodeiam que nós não somos iguais. E que o cabelo liso não é mais bonito que o crespo. Que não existe cabelo ruim e cabelo bom. Existe apenas cabelo.
3) Não seja um pai/mãe que alisa o cabelo da filha. Isso não é legal.
4)Nunca use as palavras "gordo" ou "magro" com tom pejorativo. Entenda de uma vez por todas que nem todo mundo que é gordo quer ser gordo e nem todo mundo que magro quer ser magro. Existem distúrbios físicos, psíquicos e alimentares que fazem as pessoas chegarem naquele ponto. E, de todo modo, se a pessoa de fato resolveu que quer ser gorda/magra, isso não é da sua conta. Do mesmo modo que alguém muito magro não quer se matar na academia para ganhar massa muscular e algumas curvas, o gordo pode estar bem feliz sendo do jeito que é.
5) Não sugira dietas, receitas, médicos e nutricionistas. As pessoas costumam ter espelhos (e até balança) em casa. Eles também compram roupas com a mesma frequência que você e sabem que o tamanho deles é 34 ou 50.
6) Aquilo que é bom pra você, é bom pra VO-CÊ. Não enfie guela abaixo o SEU padrão de corpo, felicidade e estética nas pessoas que te rodeiam. Sobretudo se essas pessoas forem crianças.

Definitivamente: se eu viver até uns 85 anos significa que ainda vou viver mais 60 anos. Durante esses 60 anos eu pretendo ter filhos, estudar e viajar. Viajar muito. E, na vida que eu escolhi viver, não haverá espaços para clareamento dental frequente, massagens modeladoras semanalmente, dietas, privações e horas na academia. Acredito que o exercício físico precisa ser prazeroso. Pessoalmente, eu o executo somente para fins de saúde e condicionamento físico. Dispenso conscientemente um bumbum durinho e um abdome definido. Deus que me livre de fazer abdominal todo santo dia (aliás, eu agravei um problema na lombar por causa dos abdominais). Com o perdão do trocadilho, eu abomino abdominais desde então.

Se seus exames também mostram que seu colesterol ruim está baixo e o bom está alto, o triglicérides está ok, o ácido úrico também, porque mesmo você quer se matar na academia e não comer aquele brigadeiro na festinha? Ah, sim. Porque você quer ser uma Barbie. Ou um Ken. E pode até ser que você consiga. Comendo coisas que não gosta, não comendo aquilo que gosta, sofrendo privações, se matando na academia pelo triplo de horas que seria realmente necessário, fazendo uma lipo, colocando um botox, um silicone e, principalmente, deixando de viver sua vida.

PS: Queria só registrar o ódio que eu sinto de gente que procura hotel com academia. Exceto raros executivos que viajam a maior parte do mês e atletas, se você é uma pessoa comum peloamordedeus não procure hotel com academia. Você está de férias, amigão. Devia saber o que isso significa.

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